Inovar em seguros é um caminho sem volta para garantir o futuro

O crescimento virá para aqueles que fundamentarem a estratégia no tripé experiência do cliente, tecnologia e ESG, avaliam os especialistas

48 palestras, 14 speakers brasileiros e estrangeiros e quase 2 mil pessoas para ouvir, aprender e negociar. Este foi o clima do CQCS Insurtech & Innovation, considerado um dos maiores evento de inovação em seguros na América Latina, realizado pelo corretor e empreendedor Gustavo Doria, com o apoio de quase 80 patrocinadores, sendo os dois principais Bradesco Seguros e BB Seguros, que respondem por quase a metade do lucro líquido do setor.

Mostrar o potencial e desafios do setor frente a inovação era a proposta do evento, realizado em São Paulo nos dias 25 e 26 de julho, que reuniu investidores, seguradoras, resseguradoras, corretores, empresas de assistência e de tecnologia. Os participantes, preocupados com diversos desafios que o setor enfrenta para decolar, saíram do evento convencidos de que há muitas oportunidades de negócios em seguro em todas as áreas, desde os seguros demandados pela população, como celular, até proteções financeiras para garantir os grandes projetos de infraestrutura.

Há também desafios imensos regulatórios, tecnológicos e de comunicação a serem superados para aumentar a base de clientes, estimada em 30% da população. A economia também precisa decolar, os investidores aportarem recursos em projetos de infraestrutura, os juros baixarem, a renda da população aumentar, o crédito fluir com a redução da inadimplência das famílias e das empresas, além de outras ações básicas e urgentes como melhorar indicadores de educação, moradia, saneamento…

A comunicação também é prioridade do setor. “Segurês não!” foi um dos temas do evento e esteve presente em praticamente todas as falas dos mais de 140 palestrantes do evento. “Transformar o segurês em uma linguagem acessível à população é um dos principais pilares para que o setor de seguros se aproxime dos brasileiros”, citou o organizador Gustavo Doria, que promoveu a campanha em parceria com a CNseg, a confederação das seguradoras.

“É preciso existir uma evolução dos canais de comunicação para que se estabeleça uma melhor conexão entre os indivíduos. O digital transformou tudo na comunicação porque tínhamos uma iniciativa mais passiva, focado no que o indivíduo gostaria de falar. Hoje os meios digitais passaram a priorizar o que os consumidores querem saber. Isso vem de uma base de dados, de um processo de entender as questões comportamentais”, disse a CMO da Icatu Seguros, Cinthia Kato.

Eugenio Paschoal, CEO da Marsh, maior corretora de seguros do mundo e do Brasil, citou o atual governo como um vetor para o crescimento do diálogo entre os setores público e privado. “Temos uma grande oportunidade com um governo sensível às causas sociais. Dados mundiais mostram que a participação do setor de seguros na reconstrução de uma sociedade diante de perdas com catástrofes varia entre 30 e 40%. É hora de nos mobilizarmos na melhoria de sistemas de distribuição, inteligência artificial e afins. O papel das seguradoras e das resseguradoras é fundamental para o equilíbrio entre poder público e privado”.

Num cenário econômico favorável, a grande aposta está em ampliar e treinar os canais de distribuição de seguros. Dos R$ 355 bilhões do faturamento do setor em 2022, a maior fatia da venda chegou às seguradoras pelas mãos dos mais de 120 mil corretores de seguros. A tecnologia exige investimentos parrudos aos profissionais de vendas, que passam por uma intensa consolidação para ganho de escala, redução de custos e aprimoramentos para os certificarem como consultores financeiros com uma visão 360 graus de seus clientes. 

“Nós precisamos de pluralidade no mercado de seguros e, um grande caminho para essa realidade se faz através da tecnologia, fundamental nesse processo de avanço do setor. No entanto, ela é o meio. Não é o fim. O corretor de seguros é o protagonista para a solidificação do mercado e para a viabilização dos produtos”, afirma Ivo Machado, vice-presidente da EZZE Seguros.

De forma unânime, boa parte dos palestrantes do evento concorda que o crescimento virá para aqueles que fundamentarem a estratégia no tripé experiência do cliente, tecnologia e ESG. Cuidar do meio ambiente, da sociedade e da governança é tido como uma condição si ne qua non para a sobrevivência do negócio em si. “Convicção, conveniência ou constrangimento. As empresas que não mudarem por convicção ou conveniência, mudarão pelo constrangimento de serem canceladas por clientes, fornecedores e acionistas”, afirma Edson Franco, CEO da seguradora Zurich Brasil.

A CEO da AXA, Erika Medici, ressalta que a atividade de seguros é inerente à sustentabilidade do crescimento de qualquer economia. “Se pensarmos na essência do seguro, já temos como ponto de partida um alinhamento com a agenda ESG ao prover resiliência financeira aos nossos segurados ao mitigarmos as perdas com imprevistos”. Ela cita, por exemplo, a reposição de um celular para entregadores de delivery. “Sem o telefone, ele perde a renda familiar. O seguro ajuda a repor o bem em caso de problemas como roubo e estamos fazendo isso em poucos dias”.

Energia verde – Com a sustentabilidade e a tecnologia em punho, as apostas se diversificam em vários segmentos. Em grandes riscos, segmento que sofre desde 2014 com investimentos paralisados com a investigação Lava Jato, o boom de contratação está em especialistas em infraestrutura, agricultura, bem como riscos climáticos e cibernéticos. Segundo tem divulgado o governo Lula, o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) previsto para ser lançado em 11 de agosto, contará com investimento anual de R$ 60 bilhões, somando R$ 240 bilhões ao longo do mandato lulista, e parcerias público-privadas.

O brilho nos olhos dos seguradores se intensifica quando falam da corrida do novo ouro do mundo: a energia verde. Para produzi-la, minerais em abundância no Brasil, como lítio, terras raras, níquel, cobre entre outros. Segundo Edson Franco, Erika Medici, Angelo Colombo, CEO da Swiss Re Corporate Solution, Ariel Couto, CEO da MDS e outros palestrantes, o Brasil tem pela frente uma grande oportunidade de assumir o protagonismo de uma economia verde.

“Os produtos e serviços securitários são fundamentais para viabilizar todas as iniciativas públicas e privadas para essa transição”, afirma o CEO da Zurich. No Brasil, estudo da McKinsey estima que os mercados de energia renovável, energia e materiais de base biológica e mercados de carbono devem movimentar mais de US$ 124 bilhões no Brasil até 2040.

Seguradores, corretores e resseguradores priorizam projetos sustentáveis para serem priorizados por seus clientes. “Criamos uma inteligência de dados para rastrear o fluxo de dinheiro. São bilhões de dólares administrados pelos fundos de private equity mundialmente em busca de bons projetos e o Brasil tem se destacado como um dos celeiros para energia verde”, afirma Eduardo Takahashi, CEO da corretora de seguros WTW (Willis Towers Watson).

Assim como a Willis, a estratégia dos concorrentes nacionais e internacionais também é “follow the money”. “Esses projetos demandam vários seguros e nós investimos em especialistas para conquistar negócios relevantes na área de energia”, conta Adriano Oka, CEO do braço ressegurador da OneGlobal, consultora de seguros inglesa que tem como acionista o fundo JC Flowers, com mais de US$ 22 bilhões administrados por um ex-Goldman Sachs. “Temos muita disposição em liderar os programas de seguros nesta corrida pela transição energética no mundo”, acrescenta Nery Silva, CEO Mercosul da Oneglobal na América Latina.

Seguros pessoais sob medida – Em massificados, as prioridades são vida, previdência, residência, viagem, equipamentos eletrônicos e conectados a mobilidade, principalmente carros e bikes.  Automóveis, maior carteira de seguros gerais com arrecadação de R$ 50,9 bilhões em 2022, vem perdendo espaço para outros produtos. Ney Ferraz Dias, diretor da Bradesco Auto/RE, afirma que a tecnologia tem contribuído para a conquista de novos clientes fora do escopo de veículos com até 5 anos de uso.

“Com a capacidade de processamento da inteligência artificial, conseguimos gerar e usar, com base em dados, uma precificação cada vez mais personalizada. Também aprimoramos serviços, pois 50% dos sinistros são decorrentes da falha humana. Com dispositivos de segurança, este risco será cada dia menor, tornando serviços um fator decisivo na conquista e manutenção dos clientes”, afirmou. 

No disputado segmento de seguro de vida e previdência, com arrecadação de R$ 214 bilhões no ano passado, há um potencial que chama a atenção mundial. O seguro de vida (R$ 58 bilhões) ainda ignorado por grande parte dos corretores de seguros, com vendas predominantemente em canais bancários. Atualmente, no Brasil, 17% da população têm algum tipo de seguro de vida. Há duas décadas e meia, esse percentual era de apenas 5%. Em contrapartida, em países desenvolvidos como os EUA, 70% da população possui seguro de vida, enquanto no Japão esse percentual salta para 90%.

As seguradoras investem para mudar esta realidade, principalmente na criação de produtos simples, sem “segurês” para que o cliente entenda o que está comprando, plataformas digitais e treinamento dos vendedores. O foco está em atrair o consumidor com ofertas para uso de serviços em vida, como indenizações para doenças graves, diária de internação hospitalar, invalidez, uso de telemedicina. Até pouco tempo atrás, o seguro de vida era voltado basicamente para pagamento de indenizações aos beneficiários por morte do titular.

“Temos um imenso desafio para levar produtos para seis gerações, nascidos entre 1925 até os dias de hoje”, destaca Jorge Nasser, presidente da Bradesco Vida e Previdência, que dividiu o palco com Ricardo Teixeira, CEO Centauro ON, e Patrícia Freitas, CEO da Prudential. Todos enfatizaram as vantagens dos produtos para despertar o interesse dos vendedores para a crescente demanda pós pandemia. 

Segundo eles, há um novo consumidor de seguro de vida e por isso está em curso uma reinvenção dos produtos e das ferramentas de vendas. O consumidor não espera que o corretor apenas venda uma cobertura. É preciso oferecer uma solução a ele nas diferentes fases da vida. “Na Prudential, temos uma verdadeira obsessão por melhorar a experiencia do cliente para democratizar o seguro de vida”, destaca Patricia Freitas.  

Luciano Soares, CEO da Icatu, acredita que, ainda que pareça óbvio, é importante ressaltar o cenário macro, onde o cliente está inserido. “O cenário atual é marcado por mudanças rápidas, onde os clientes buscam soluções completas e seguras, abrangendo bens, investimentos, previdência e seguro. Nesse contexto desafiador, o canal de distribuição enfrenta uma importante missão: auxiliar os clientes a navegarem pelas diversas opções de proteção e planejamento financeiro”, afirma.

Inovar em meios de pagamentos é uma questão muito relevante para todos as seguradoras interessados em vender produtos para as classes C e D. “O boleto bancário está com os dias contados. A tendência que vemos é o pagamento via Pix e cartões de crédito”, disse Rivaldo Leite, CEO da Porto Seguros, a maior seguradora de carro e casa do Brasil. “Principalmente para quem quer vender seguros com tíquetes de médio e baixo custo. Se não tiver um meio de pagamento ágil e barato, não conseguirá evoluir”, comentou no painel “O digital acelerando o distribuidor de seguros”, ao lado de José Adalberto Ferrara, CEO da Tokio Marine, e João Geo Neto, CEO da Pottencial.

Ferrara destacou que os corretores de seguros devem aprender a mexer nas redes sociais e estarem presentes nestas plataformas, principalmente para alcançar diferentes nichos e públicos de diversos lugares: “É uma oportunidade enorme para ampliar o canal de vendas, ir para regiões que não são atendidas e aproveitar um momento bom, porque a indústria só cresce, o mercado só evolui.”, enfatiza o executivo da Tokio. 

Comunicação, regulação e investimentos – A Susep (Superintendência de Seguros Privados) pilota a simplificação da atuação das seguradoras para estimular a demanda por proteções financeiras que garantam os direitos dos consumidores. “A economia securitária tem papel fundamental no uso de novas tecnologias, servindo tanto como um amenizador de risco”, define o titular Alessandro Octaviani, acrescentando que a autarquia se dedica a “aprimorar a fiscalização exercida pela Susep, para, no fim da linha, garantir o pagamento do consumidor quando ele precisar usar a proteção que contratou. Os consumidores terão informações para serem fiscalizadores do mercado”.

Já a CNseg orquestra a comunicação com todos os públicos para um melhor entendimento do papel social do setor entre governantes e consumidores. O desafio é criar condições para que a arrecadação do mercado salte dos atuais 6,4% para 10% do PIB nacional em 2030, segundo o Plano de Desenvolvimento do Mercado de Seguros, Previdência Aberta, Saúde Suplementar e Capitalização (PDMS). 

“É um plano dinâmico e queremos que todos participem com suas ideias, principalmente os corretores de seguros, que trazem a demanda do consumidor para que as seguradoras possam desenvolver novos produtos. É importante nos unirmos em torno dessas ações, defendendo as mesmas ideias e levando para o governo, para o legislativo, para a mídia essas ações. Juntos será difícil. Separados, impossível”, defendeu Dyogo Oliveira, presidente da CNseg. 

Se depender das seguradoras, o objetivo é factível. “Inovar é estar cada vez mais próximo dos clientes e parceiros, buscando o aperfeiçoamento contínuo. Há 40 anos, o grupo Bradesco Seguros tem a inovação como aliada estratégica para levar nossas soluções de proteção a cada vez mais pessoas. Também é importante mencionar que estamos nos aperfeiçoando cada vez, investindo na capacitação não apenas dos corretores, mas dos nossos profissionais, das pessoas que trabalham conosco diariamente, para atender melhor as demandas que o mercado nos apresenta”, disse o presidente Ivan Gontijo na abertura do evento, em consonância com o discurso de todos os seus pares presentes no evento.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Ouça nosso podcast

ARTIGOS RELACIONADOS