Ética se pratica. Ponto final

Hoje li um artigo da Lucy Kellaway, colunista do “Financial Times”, no portal do Valor Econômico. Realmente muito bom, principalmente para servir de exemplo para as seguradoras, que começam a incluir na agenda várias iniciativas sustentáveis. Eis aqui um exemplo para nunca ser copiado!!!!

Veja o texto na íntegra

O cardápio idiota do UBS deixa um gosto amargo na boca
Por Lucy Kellaway

Um leitor foi convidado recentemente para almoçar no restaurante privativo do UBS de Londres. Na mesa, à sua frente, um cardápio mostrava o que ele iria comer. Ao virar o cartão, no entanto, encontrou uma estranha declaração impressa.

É um tanto longa, mas a citarei na íntegra, já que é o exemplo mais extremo que já vi dos tropeços de uma empresa ao tentar provar o quanto é sólida e saudável: “No UBS promovemos uma cultura corporativa pautada pelos mais elevados padrões éticos presentes em todas as áreas de nosso campo de atuação. Nosso compromisso para com a excelência em tudo o que fazemos, associado ao desejo de compreender e atender às necessidades de nossos clientes, se traduz na experiência dos nossos clientes de saborear uma refeição. É por isso que, sempre que possível, nossos menus são elaborados a partir dos melhores produtos de época, provenientes de origens éticas, orgânicos e inigualáveis em qualidade e valor. Como nossas operações.”

Esta é uma lição prática de como não fazer as coisas. Para começar, nenhuma organização deveria anunciar publicamente que é ética. São raras as empresas que deixam de fazer isso, mas esse é um ato sem qualquer sentido. Que companhia, afinal, diria que é antiética?

Além disso, a afirmação parece especialmente cômica vinda de um banco que recentemente perdeu seu principal executivo depois que Kweku Adoboli fez desaparecer US$ 2,3 bilhões em transações supostamente não autorizadas, e que vem tendo problemas junto às autoridades britânicas e americanas.

Mais estúpido ainda é afirmar que se possui “os mais elevados padrões éticos”. Que padrões são esses? Seriam os que concentram as aspirações de Madre Teresa? Se forem, eles tornariam a maioria das atividades comerciais normais impossíveis.

Declarar um “compromisso para com a excelência em tudo o que fazemos” é outra má ideia. Para se ser competitivo, algumas coisas têm de ser realizadas com excelência, enquanto outras precisam apenas ser feitas de maneira adequada. Os bons dirigentes sabem a diferença. Preciso tentar escrever uma coluna excelente (embora testes tenham mostrado que nem sempre consigo). Não preciso ser excelente em arrumar minha mesa ou em responder a e-mails.

Ainda pior é a ideia de que a ética e a excelência se traduzem “na experiência dos nossos clientes de saborear uma refeição”. Essa expressão medonha lança o estado de espírito de qualquer um em queda livre. Referir-se à “experiência do usuário” que se tem quando se experimenta um novo dispositivo tecnológico é horrível, mas rebatizar o que se conhece como “almoço” de “experiência de saborear uma refeição” é intolerável.

Somos informados que os menus são “elaborados” com o uso “dos melhores produtos de época”, que são “orgânicos” e “provenientes de origens éticas”. Não vejo por que uma empresa que despacha seus dirigentes para o mundo inteiro deva impor um limite à importação da exótica vagem queniana no auge do inverno. Orgânico, como qualquer pessoa sensata sabe, é uma enganação e “provenientes de origens éticas” é vago demais para significar alguma coisa.

O que aborrece ainda mais é a ideia que a comida servida aos clientes do UBS é “inigualável em qualidade e valor”. Isso não é apenas feio, mas pode ser ilegal. Se a cozinha do banco está realmente servindo comida de qualidade superior a qualquer coisa produzida até agora, o departamento de compliance precisa ficar atento. Saborear uma refeição tão sublimemente deliciosa certamente infringiria a nova Lei Federal Antipropina do Reino Unido.

Mas a “pièce de résistance” nessa declaração, que é um verdadeiro prato cheio, é a última frase, que tenta comparar a empresa à experiência do cliente de saborear uma refeição. Li três vezes e não consigo fugir à conclusão que as operações bancárias devem ser orgânicas e provenientes de origens éticas.

Você poderia dizer que estou me empolgando demais com isso. Afinal, trata-se apenas de algo escrito por algum bobão do departamento de restaurante e, assim, talvez não tenha importância. Mas tem, sim. É preocupante as empresas escreverem coisas insensatas e as entregarem a seus clientes.

Em primeiro lugar, nenhum cliente jamais se sentirá tocado por esse besteirol, a não ser para copiá-lo e encaminhá-lo para mim. Em segundo, essas declarações fazem a gente temer que o banco esteja perdendo o rumo de modo geral. É preciso permitir que o almoço seja apenas almoço.

As declarações sobre ética deveriam se limitar a uma lista, enfiada goela baixo dos funcionários regularmente, de coisas erradas que eles não fazem – transações não autorizadas, por exemplo.

A melhor maneira de impressionar clientes não é falar sobre ética no verso dos menus, mas agir de acordo com ela no almoço – e também no resto do tempo.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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