De que forma o ESG tem ajudado a elevar as vendas de D&O? Pensando neste tema, procurei Fernando Saccon, Superintendente de Linhas Financeiras e Seguro Garantia da Zurich no Brasil, para entender mais a atuação das seguradoras neste seguro que chegou a vender quase R$ 1 bilhão em 2020 no Brasil, alta de 53% em relação a 2019. “Já há algum tempo que temos percebido no Brasil um aumento das atividades investigatórias e regulatórias por parte das autoridades competentes. Soma-se a isso, o ativismo crescente por parte da sociedade para que as empresas sejam mais conscientes e responsáveis em relação aos seus impactos e que sejam também agentes de mudança em um mundo em transformação. Outro componente importante é o aumento no interesse dos investidores em negócios com foco na sustentabilidade do meio-ambiente e boas práticas sociais e de governança (ESG na sigla em inglês)”. Leia abaixo os principais trechos da entrevista concedida ao blog Sonho Seguro.
Obrigada por atender o pedido. Nos conte, como o ESF se insere no seguro D&O?
Nesse cenário, torna-se ainda mais relevante o papel dos executivos das companhias que passa a incluir também a definição das metas ESG das organizações em que atuam em seus KPIs de acompanhamento. Neste sentido, temos visto cada vez maior presença regulatória para tentar padronizar o reporte ESG das companhias, como recente proposta da CVM para incluir os fatores ambientais, sociais e de governança no Formulário de Referência das empresas de capital aberto. Dessa forma, há nitidamente um aumento na possibilidade de as decisões dos gestores das corporações passarem a ser alvo de questionamentos relacionados, por exemplo, ao não atingimento dos indicadores ESG das companhias ou ao não cumprimento das legislações aplicáveis as quais estejam sujeitas.
A importância dos princípios de governança, ambiental e social nos últimos meses já chegou na Justiça?
Cada vez mais as questões ESG têm gerado litígios, como ações judiciais de acionistas contra as empresas e seus executivos, por exemplo, acusando-os de não cumprir compromissos relacionados à agenda ambiental, social e de governança. O escrutínio por parte dos investidores, reguladores, consumidores e da sociedade é cada vez maior e as empresas devem buscar se adequar a esta nova realidade para que se mantenham relevantes e para mitigar os potenciais riscos associados a este contexto. Todas essas demandas podem ter cobertura do D&O. E o aumento crescente da conscientização dessas realidades por parte das empresas tem impactado no aumento das vendas desse tipo de seguro.
O quanto cresceu as vendas do D&O nos quatro primeiros meses do ano?
As vendas da Zurich para o seguro de D&O cresceram mais de 25% nos quatro primeiros meses deste ano em comparação com o mesmo período de 2020.
Tem dados estatísticos desde o início do D&O no Brasil?
Podemos afirmar que hoje o D&O é um seguro maduro no país, com bom volume de contratações. Entretanto, alguns eventos específicos têm sido grandes responsáveis pelo seu desenvolvimento e crescimento durante os anos. Primeiro, questões relacionadas a operações com derivativos das companhias que causaram grandes sinistros levantaram os primeiros alertas com relação a importância do seguro. Posteriormente, eventos como a Operação Lava Jato e todas as suas consequências deixaram os administradores mais expostos à responsabilização por suas condutas. Por fim, questões relacionadas a ESG e riscos cibernéticos têm sido motivo de grande preocupação recente por parte dos administradores. Todos esses fatores, muitas vezes consolidados em legislação e novos regramentos responsabilizando cada vez mais as condutas dos administradores das empresas, têm potencializado a venda desse produto.
Quais coberturas são mais solicitadas?
A cobertura mais utilizada normalmente se refere a custos de defesa, ou seja, custos com honorários advocatícios para defender o administrador principalmente em questões tributárias, ambientais e regulatórias. Vale ressaltar que o fato do seguro conceder cobertura também para acordos é comumente utilizado em grandes demandas, especialmente ações de classe (class actions) iniciadas contra administradores e empresas com ações negociadas em bolsas de valores nacional e/ou estrangeira, neste último caso muito comum ter ações dessa natureza nos Estados Unidos.
Como o “quase” fim da Lava Jato impacta este seguro tanto em termos de vendas como em regulação dos sinistros que estavam relacionados a investigação?
Desde 2014, com as operações Lava Jato, Zelotes, entre outras, muitos setores foram afetados e diversas empresas tiveram custos incorridos na defesa de seus administradores, diretores, conselheiros, entre outros gestores envolvidos, além também dos acordos realizados nesses processos. Esse novo cenário, criado a partir das recentes decisões do Supremo Tribunal Federal, traz um ambiente desafiador para o seguro D&O, mas também oportunidades para amadurecimento e desenvolvimento do produto no mercado nacional. Com essa decisão, processos terão que se iniciar novamente do zero, podendo gerar novos valores a serem indenizados, mas é importante ressaltar que eventos cometidos com dolo continuarão não sendo passíveis de cobertura securitária.
Quais os principais segmentos da economia que buscam por D&O?
Não há um segmento específico que se interesse mais ou acabe buscando o seguro de D&O. O mais interessante de todos esses eventos que ajudaram no desenvolvimento do produto é o fato de ter permitido uma maior diversificação da carteira de clientes por parte das seguradoras e uma maior busca das empresas, independentemente do setor e tamanho, pela cobertura securitária
A CVM aplicou R$ 950,5 milhões em multas a infratores do mercado de capitais em 2020. A cifra é 8,7% inferior ao recorde de 2019, quando a autarquia superou a marca de R$ 1 bilhão em penas pecuniárias. Mas devem aumentar, pois foi a pandemia que resultou na queda. O quanto isto impactou o seguro?
Precisamos avaliar de maneira mais profunda quais foram as ações que resultaram nessas multas, bem como agente responsável e se a empresa contratava seguro de D&O à época ou não. Entretanto, considerando que o mercado pratica hoje em dia uma cobertura específica para multas e condenações pecuniárias, entendemos essas cifras como mais um argumento que demonstra a importância do seguro para se proteger de condenações deste tipo de um órgão regulador atuante como a CVM.
Os IPOs seguem um ritmo acelerado. Todos são adeptos da contratação de D&O? Se não, E&O, POSI? Qual o percentual que opta por não comprar seguro?
A Zurich tem procurado equilibrar a exposição do seguro D&O com outras modalidades, diversificando o mix de produtos na carteira. Falo do seguro cyber, cujo risco tem se intensificado com a pandemia, e do seguro POSI, que também é contratado pelas empresas para protegê-las, assim como a seus executivos, contra reclamações relacionadas às ofertas públicas de valores mobiliários. Tais demandas ocorrem em situações como nas de danos causados a investidores em razão da falha das empresas ao prestar informações disponibilizadas no prospecto de suas ofertas públicas, sendo as mais comuns as ofertas iniciais (IPO) e subsequentes (follow on).