Os depósitos em planos de previdência VGBL podem registrar uma queda de R$ 50 bilhões na arrecadação anual com as mudanças anunciadas pelo governo federal. Em uma década, o valor pode alcançar R$ 500 bilhões. A estimativa é do presidente da Fenaprevi (Federação Nacional de Previdência Privada e Vida), Edson Franco, e foi apresentada nesta quarta-feira (12) durante coletiva de imprensa para detalhar os impactos da nova cobrança de IOF sobre contribuições superiores a R$ 50 mil por mês.
Segundo Franco, a medida representa um “auto boicote” à política pública de estímulo à poupança de longo prazo e afeta diretamente a classe média brasileira — público-alvo do VGBL. “Essa desaceleração não foi observada nem no pior momento da pandemia. Estamos diante de um problema autoimposto, com consequências extremamente nocivas”, afirmou.
Nas duas semanas seguintes à edição do decreto, a queda nas contribuições ao VGBL foi de 80%, o que representa cerca de R$ 3 bilhões por semana. Em um mercado que vinha crescendo mesmo em momentos de adversidade econômica, a freada repentina é vista como sintoma de uma falha estrutural na estratégia fiscal do governo.
Desestímulo à poupança e contradição com políticas de longo prazo
A medida em questão impõe a cobrança de IOF de 5% sobre aportes superiores a R$ 50 mil mensais em planos VGBL. Esse imposto incide sobre o valor nominal do aporte, e não apenas sobre os rendimentos, o que segundo a Fenaprevi e a CNseg, distorce a lógica da previdência privada, construída com base na acumulação e no incentivo de longo prazo.

“Estamos penalizando quem se organiza financeiramente, quem planeja seu futuro. É uma contradição com o que se espera de um país que precisa construir um sistema robusto de financiamento de aposentadorias e envelhecimento populacional”, declarou Dyogo Oliveira, presidente da CNseg, confederação das seguradoras.
Franco destaca que a alíquota efetiva de tributação sobre a rentabilidade do VGBL pode chegar a 79% nos primeiros dois anos, tornando o produto extremamente desvantajoso se comparado a outras alternativas de investimento. “É uma forma de hipertributação. A pessoa que faz um aporte extraordinário, uma única vez na vida, por exemplo, ao vender um imóvel ou receber uma herança, é punida com 5% na entrada. Esse desincentivo desloca o investidor para produtos isentos de curto prazo, como LCAs e CRIs.”
Um dos argumentos centrais apresentados pelo governo ao justificar a medida foi o de tributar os “super-ricos”. Para o setor, esse é um diagnóstico equivocado. De acordo com a Fenaprevi, os principais atingidos são justamente os integrantes da classe média que, em algum momento, fazem aportes extraordinários para acelerar sua poupança previdenciária.
“Não são 50 mil brasileiros super-ricos. São 50 mil famílias que, por um motivo pontual, buscam garantir o próprio futuro sem depender do INSS. O super-rico está em fundos exclusivos, isentos e sofisticados. O VGBL é o produto da classe média”, reforçou Franco.
Segundo o executivo, a tributação de um dinheiro que já foi tributado anteriormente, seja via imposto de renda ou ganho de capital, é um “erro sobre outro erro”. “É uma aberração do ponto de vista técnico, moral e jurídico”, disse.
O setor aponta que a medida cria uma injustiça fiscal sem precedentes. A carga total de tributos pode atingir até 93% da rentabilidade de um plano no caso de resgate antecipado, por exemplo, por motivo de doença ou morte. Além disso, a nova regra impõe uma complexidade operacional inviável para seguradoras e clientes.
Como não há sistema unificado que permita verificar os aportes realizados pelo cliente em outras instituições, a Receita Federal delegou às seguradoras a responsabilidade de perguntar se houve contribuições em outros planos — transferindo, na prática, o ônus da veracidade da informação ao próprio contribuinte.
“A solução proposta é perguntar ao cliente se ele ultrapassou o limite de R$ 50 mil e confiar que ele diga a verdade. Se ele esquecer, ou errar, a responsabilidade passa a ser dele. Isso gera um enorme risco jurídico e quebra a confiança no produto”, criticou Edson Franco.
A CNseg também alertou para outra contradição presente no pacote anunciado: a elevação da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) que incide sobre o segmento de capitalização, usado inclusive como instrumento de garantia para obras públicas no novo regime de garantias. “O governo está, de um lado, estimulando o uso de capitalização como garantia em projetos de infraestrutura, e de outro, encarecendo essas mesmas garantias ao aumentar a carga tributária sobre o setor. É um tiro no pé do próprio Estado”, afirmou Dyogo Oliveira.
A Fenaprevi e a CNseg afirmaram que já iniciaram articulação com o Congresso Nacional. Um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) que busca anular os efeitos do decreto deverá ser votado em regime de urgência ainda neste mês. Só depois deste desfecho é que se pensará em levar a questão ao Judiciário.
Segundo os executivos, a tramitação agora no Legislativo abre espaço para um debate mais sensível e democrático. “Antes era uma discussão com o Executivo. Agora, entramos no Congresso, onde há maior compreensão da importância da previdência e da necessidade de preservar o equilíbrio entre os produtos financeiros”, disse Franco.
Para Dyogo Oliveira, a lógica da medida vai contra qualquer diretriz moderna de política econômica. “O caminho para o país é controlar gastos, não aumentar impostos sobre quem já paga. É preciso criar um sistema tributário que favoreça investimentos de longo prazo, e não o contrário.”
Abaixo a íntegra da FenaPrevi:
NOTA À IMPRENSA – TRIBUTAÇÃO IOF SOBRE PLANOS VGBL
A Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg) e a Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi) avaliam que o Decreto nº 12.499, publicado na edição extra do Diário Oficial da União na noite de quarta-feira, dia 11 de junho, apresentou avanços acerca da incidência de IOF nos planos de seguros de vida com cobertura por sobrevivência (VGBL), estabelecida no Decreto 12.466, no entanto ainda está longe de solucionar o problema.
A nova norma, que supostamente tenta atingir a parcela da população classificada como “super ricos”, ainda vai impactar o principal instrumento de proteção previdenciária da classe média – o VGBL.
Os limites impostos pelo novo Decreto, diferentemente do anunciado, impactam diretamente a classe média que em virtude de resgates do FGTS, venda de imóveis, recebimento de heranças ou benefícios decorrentes de convenções trabalhistas, bem como os resultantes da migração de recursos acumulados em aplicações financeiras, será penalizada tributariamente se destinar esses recursos para um plano VGBL como planejamento previdenciário.
Importante ressaltar que o VGBL não é um produto voltado para investidores que buscam ganhos de curto prazo. Isso porque já possui uma penalização tributária para recursos que não permanecem no plano por um longo período. A alíquota de imposto de renda de 35% para resgates de aportes mantidos por menos de 2 anos é muito superior à observada no mercado financeiro.
Com a incidência de IOF, nos termos do novo Decreto, o custo tributário efetivamente cobrado sobre rendimentos se elevará para 44%, iniciando em 79% nos 2 primeiros anos.
No novo modelo, se o resgate precisar ser efetuado no primeiro ano, o trabalhador, ou seus familiares, serão penalizados com uma tributação equivalente a 93% da rentabilidade obtida.
Trata-se de uma enorme injustiça tributária e social para uma parcela da população que enfrenta o desafio do envelhecimento em um cenário de crise na previdência pública.
A FenaPrevi estima que, se não houver mudança no cenário, haverá uma redução de R$ 50 bilhões no volume arrecadado anualmente, alcançando R$ 500 bilhões na próxima década. Esse volume é, inclusive, majoritariamente utilizado para financiamento da dívida pública.
Por fim, a norma impõe ainda às seguradoras exigências operacionais inexequíveis, repassando o ônus operacional de recolhimento do IOF para o segurado, provocando também uma assimetria operacional para o VGBL em relação aos produtos do mercado financeiro.
Diante do retrocesso dos esforços construídos ao longo dos anos, inclusive pelos poderes legislativo e executivo, para reduzir a lacuna de proteção financeira/previdenciária de nossa população, a CNseg e a FenaPrevi vão prosseguir em conversas com interlocutores do Governo Federal e do Congresso Nacional para correção dos equívocos aqui apresentados.