Presença feminina no setor de seguros evolui, mas desigualdades persistem

Com mais de 600 entrevistas, o estudo da ENS com apoio da Sou Seguras se consolida como referência para o mercado na análise da trajetória da mulher no setor

Em um setor historicamente marcado pela presença masculina nas lideranças, a evolução da mulher no mercado de seguros começa a ganhar corpo — mas o topo da pirâmide ainda parece distante. É o que revela a 5ª edição do estudo “A Mulher no Setor de Seguros”, lançado pela Escola de Negócios e Seguros (ENS) com o apoio da entidade Sou Segura.

Realizado ao longo de mais de uma década, o levantamento é considerado um dos mais completos diagnósticos sobre a participação feminina no setor, tanto do ponto de vista quantitativo quanto qualitativo. Nesta edição, o estudo colheu mais de 600 entrevistas com profissionais mulheres, ampliando significativamente a base de comparação em relação às edições anteriores.

“Esse é um estudo de referência para o setor. Construiu-se uma série histórica que permite enxergar tendências, avaliar progressos e identificar gargalos importantes na jornada das mulheres no mercado segurador”, afirma Maria Helena Monteiro, diretora de Ensino da ENS. “É também um instrumento de transformação, pois traz elementos concretos para fomentar políticas mais inclusivas dentro das empresas.”

O que dizem os números

A pesquisa mostra que a presença feminina nas seguradoras brasileiras ultrapassa a masculina: 55% da força de trabalho do setor é composta por mulheres. Entretanto, nos cargos de direção, os homens ainda são maioria. A proporção é de dois diretores para cada diretora — uma melhora em relação à relação de 4 para 1 observada há dez anos, mas sem avanço desde a última edição do estudo, em 2022.

“Há avanços importantes, mas ainda lentos. A presença feminina aumentou, sim, mas a ascensão aos cargos de comando continua restrita”, analisa o economista Francisco Galiza, coordenador técnico do estudo. “As barreiras não estão apenas nas lideranças, mas também em aspectos estruturais, como a desigualdade salarial e a ausência de mecanismos eficazes de retenção de talentos.”

Segundo o estudo, as mulheres ganham, em média, 70% do salário dos homens nas seguradoras, mesmo quando têm níveis similares de escolaridade e participam mais ativamente de programas de treinamento. A defasagem salarial é uma realidade que também aparece em outros setores da economia, mas, no caso dos seguros, chama ainda mais atenção pela elevada presença feminina na base operacional.

Além disso, o estudo destaca um desafio recorrente: a saída de funcionárias após a maternidade, muitas vezes por ausência de políticas corporativas que favoreçam o retorno ao trabalho e conciliem as exigências da vida pessoal e profissional.

Novidades e tendências

Uma das inovações da edição de 2025 foi a análise da preferência por ramos de seguros conforme o gênero. Do ponto de vista das consumidoras, o segmento de benefícios (como seguros de vida, saúde e previdência) é visto como mais atrativo. Já entre as corretoras entrevistadas, o ramo automotivo foi citado como a melhor área de atuação profissional.

A análise também reforça a sobrecarga vivida pelas mulheres da chamada “geração sanduíche” — aquelas que cuidam simultaneamente de filhos e de pais idosos. Esse grupo relata um aumento de estresse e dificuldades para equilibrar a vida profissional com as responsabilidades familiares, especialmente após a pandemia.

Ainda assim, há otimismo. A maioria das entrevistadas reconhece avanços nas práticas de diversidade dentro das empresas e aponta o fortalecimento das entidades de representação feminina, como a Sou Segura, como fator essencial para manter o tema em destaque.

A força das vozes femininas

Mais do que números, a pesquisa se diferencia pelo peso das falas das entrevistadas. As perguntas abertas permitiram a coleta de dezenas de relatos sobre oportunidades, barreiras, sugestões e percepções sobre o mercado. “Esse material é riquíssimo. Ele mostra a realidade vivida pelas mulheres no dia a dia das seguradoras, traz o que funciona e, principalmente, o que ainda precisa mudar”, afirma Maria Helena Monteiro.

Entre os depoimentos, surgem temas como o desejo por uma liderança mais empática, a necessidade de políticas claras de equidade salarial, a importância de mentorias femininas e a valorização de competências muitas vezes invisibilizadas, como escuta ativa e gestão emocional.

“Nosso objetivo é que esse estudo seja cada vez mais usado como base para ações concretas. A transformação do setor passa por dados, mas também pela escuta ativa dessas mulheres que, todos os dias, constroem o seguro no Brasil”, reforça Galiza.

Um setor em transformação

A quinta edição do estudo chega em um momento em que o setor de seguros vive mudanças regulatórias relevantes — como o novo Marco Legal dos Seguros (Lei 15.040/24) e a regulamentação das cooperativas — e passa a exigir das empresas não apenas eficiência técnica, mas também capacidade de atrair e reter talentos diversos.

“Equidade de gênero não é apenas uma demanda social. É uma questão de competitividade, de inovação e de sustentabilidade. As seguradoras que entenderem isso sairão na frente”, conclui Maria Helena.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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