Artigo: Exigência de garantias em operações marítimos-portuárias é discussão urgente

Acidente ocorrido no último fim de semana, no Porto de Santos, foi controlado. Mas escancara riscos para centenas de outras empresas do setor portuário e suas instalações

por Rafael Ferreira é sócio da Advocacia Ruy de Mello Miller (RMM), especializado em Direito Marítimo, Portuário e Aduaneiro

O navio de contêineres CAP SAN ANTONIO não só atingiu um atracadouro de balsas que fazem a travessia Santos-Guarujá durante a manobra de saída do Porto de Santos, como também evidenciou a importância de se discutir o acesso a garantias por parte das empresas que realizam operações de transporte marítimo de cargas em portos brasileiros.

As causas do acidente ocorrido no último fim de semana serão investigadas pela Capitania dos Portos de São Paulo. Mas casos como este escancaram o alto risco ao qual as empresas que exploram terminais portuários em todo o Brasil se sujeitam diariamente, principalmente quanto às instalações e equipamentos utilizados para operações de embarque e desembarque de cargas.

No referido acidente, o navio envolvido é explorado pela gigante MAERSK LINE, maior armador de contêineres do mundo, com diversas rotas fixas para o Brasil, e que possui frota e recursos suficientes para garantir eventuais despesas e prejuízos que possam ser a ela atribuídos em razão do ocorrido, inclusive lucros cessantes.

Entretanto, os portos brasileiros recebem diariamente centenas de navios explorados por empresas que não se encontram na mesma situação. Muitas delas são armadoras de uma única embarcação, sem rotas fixas, sediadas em paraísos fiscais, sem estrutura financeira razoável e, portanto, sem condições de arcar com todas as consequências de um eventual acidente de maior proporção.

Além de questões ambientais e de proteção à vida e integridade física de pessoas, os potenciais prejuízos econômicos não se resumem aos danos diretos causados às instalações portuárias e outras embarcações, mas principalmente aos prejuízos decorrentes de uma possível paralisação da atividade em determinado terminal portuário e suas consequências.

Um terminal portuário que opera graneis sólidos para a exportação, por exemplo, não poderia ficar um único dia sem realizar suas atividades de embarque de mercadorias em navios, sob pena de verificar o surgimento de filas de trens e caminhões que abasteceriam os armazéns com mercadorias, o aumento dos custos fixos com taxas/tarifas, armazenagens portuárias adicionais e fila de embarcações aguardando para operar, causando altos custos de sobre-estadia (demurrage) de navios.

Não se pode deixar de incluir nesse cenário o fato de que a economia brasileira gira em torno das exportações de commodities e que a conclusão de tais negócios depende diretamente do bom funcionamento dos portos.

Logo, em um momento que se busca maior efetividade nas operações portuárias e maior movimento de navios nos portos brasileiros, é papel das autoridades competentes a discussão sobre medidas aptas a mitigar tais riscos, como a exigência de garantias a serem fornecidas por armadoras estrangeiras, suas seguradoras e/ou Clubes P&I para a realização de operações marítimo-portuárias no Brasil.

No caso do setor de transporte marítimo de cargas, o seguro de responsabilidade civil por perdas e danos é, em regra, oferecido por clubes de proteção e indenização (P&I Clubs – Protection and Indemnity Clubs), que são associações de seguro mútuo mantidas pelos próprios armadores membros. E já são os Clubes P&I que, no dia-a-dia do setor marítimo, oferecem garantias a eventuais acidentes nos portos brasileiros – como fianças nos casos de arresto de embarcações –, além de cuidar de todos os aspectos práticos para os armadores, como vistorias, inspeções, assistência jurídica, entre outros.

Sendo assim, uma vez que os referidos Clubes P&I já vivenciam experiências em que precisam garantir danos ocorridos em acidentes que envolvem seus associados por todo o mundo, é razoável que se discuta, com urgência, a possibilidade do oferecimento de garantias prévias às operações dos navios nos portos brasileiros por parte dos Clubes P&I. Principalmente para os armadores que não possuem estrutura financeira compatível com o risco proporcionado por sua atividade e que, se envolvidos em eventual acidente em portos brasileiros, podem nunca mais voltar ao país.

A questão está longe de ser simples e as possibilidades de execução de tais garantias são diversas. Todavia, é preciso levar com urgência casos como o ocorrido no último fim de semana às mesas de discussão que tratem do desenvolvimento e, principalmente, da segurança dos portos brasileiros.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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