Fundamentos
Revisamos nossa avaliação do setor de seguro de saúde do Brasil (BB/Negativa/B, brAA-/Negativa/–) de acordo com a metodologia de Avaliação dos Riscos da Indústria de Seguros e do País (IICRA, ou Insurance Industry Country Risk Assessment). A avaliação IICRA reflete os riscos enfrentados por seguradoras de saúde que operam no Brasil. Calculamos o IICRA em uma escala que varia de um (“risco muito baixo”) a seis (“risco muito alto”). Outro país cujo setor de seguro saúde avaliamos como “risco moderado” é a Colômbia.
Risco país: Moderado
O IICRA do setor de saúde brasileiro reflete o riscopaís moderado, com base em nossa visão dos riscos econômico e político, riscos do sistema financeiro, cultura de pagamento e Estado de Direito do país. Acreditamos que os baixos níveis de renda do Brasil, a contração econômica nos últimos dois anos e a alta da inflação limitarão o crescimento das seguradoras brasileiras e manterão a penetração de seguros em baixos níveis nos próximos dois anos.
O Brasil é a maior economia na América Latina, destacandose por possuir o principal mercado consumidor. No entanto, o PIB per capita do país se deteriorou no último ano, causando um impacto muito acima do esperado no mercado de seguros. Com a expectativa de queda no PIB per capita para cerca de US$7.159 em 2016, as perspectivas de crescimento do Brasil são, em nossa opinião, mais baixas àquelas de outros países em fase similar de desenvolvimento.
Esperamos uma contração de 3,6% na economia brasileira em 2016, seguindo o declínio de 3,8% em 2015, com ligeira recuperação de 0,5% em 2017. Em 12 de maio de 2016, Dilma Rousseff foi afastada da presidência por um processo de impeachment iniciado em dezembro de 2015, o qual está na fase final; a votação final no Senado ocorrerá nos próximos 180 dias. Seguindo o protocolo, o vice-presidente Michel Temer assumiu a presidência interinamente.
O governo Temer tem pela frente desafios semelhantes àqueles enfrentados por Dilma: recuperar a credibilidade política, retomar a trajetória de crescimento do Brasil e reverter a deterioração fiscal. Como observamos no primeiro ano do segundo mandato de Dilma, a capacidade de execução bem sucedida das políticas depende do suporte incondicional do presidente, da coesão em seu gabinete e da capacidade de obter apoio do Congresso entre os partidos. Vale ressaltar que tais condições parecem estar presentes com a posse do Vice Presidente Temer, com aparente apoio da maioria dos partidos no Congresso.
A cultura de pagamento e o Estado de Direito influenciam o desempenho das seguradoras, dada a importância de acordos contratuais de longo prazo. Nossa avaliação desse subfator no Brasil é de risco moderadamente alto, incorporando indicadores externos, como os indicadores de governança do Banco Mundial para o Estado de Direito, facilidade de execução de contratos, controle da corrupção, e o Índice de Percepção da Corrupção da Transparency International.
Risco da indústria: Intermediário
Classificamos o risco da indústria do setor de seguro saúde brasileiro como intermediário, com base 1/4 na avaliação de cinco subfatores relacionados à indústria: rentabilidade (medida pelo retorno sobre capital [ROE, ou return on equity]), risco do produto, barreiras à entrada, perspectiva de crescimento do mercado, e estrutura institucional.
Rentabilidade (Neutra)
Avaliamos a rentabilidade do setor de seguro saúde do Brasil como neutra. O índice combinado médio dos últimos cinco anos e o ROE das seguradoras de saúde totalizaram 99,7% e 9,9%, respectivamente, o que avaliamos como adequado. O setor de seguro saúde no Brasil abrange mais de mil empresas, com elevada participação de entidades sem fins lucrativos e cooperativas médicas, o que distorce os índices gerais das entidades com fins lucrativos. Dessa forma, para avaliar a rentabilidade do setor, selecionamos 17 seguradoras que representam cerca de 80% dos prêmios ganhos pelas seguradoras de saúde com fins lucrativos.
Apesar da classificação neutra, acreditamos que a vasta presença de participantes sem fins lucrativos torne o setor altamente competitivo e limite as margens das empresas com fins lucrativos. Além disso, aumentos de preços em apólices de seguro saúde individual precisam se autorização da ANS, que préestabelece níveis máximos de aumento, o que pode impactar negativamente a rentabilidade das empresas quando é necessário um forte ajuste nos preços.
Ainda, a redução no número de beneficiários, o aumento nos custos médicos devido à alta da inflação e a capacidade limitada de ajustar as apólices em vista do aumento do desemprego e a redução dos salários devem pesar negativamente na rentabilidade do setor no curto prazo. No entanto, acreditamos que a rentabilidade de empresas com fins lucrativos deva permanecer em torno de 8,5% em 2016 e 2017, ainda em linha com a classificação neutra atribuída.
Risco do produto (Negativo)
Avaliamos o risco do produto do setor de seguro saúde brasileiro como negativo, uma vez que os ajustes de preço das apólices de seguro individual, que representam cerca de 20% do total de beneficiários, são determinados pelo regulador, o que limita a capacidade das empresas de seguro saúde de reagir a riscos emergentes.
Acreditamos que a exposição a sinistros de catástrofes pandêmicas seja moderada. Até o momento, não há histórico de um evento pandêmico que tenha influenciado os sinistros. Entretanto, acreditamos que, caso ocorra um evento desse tipo, a margem para evitar tais sinistros seria limitada. Em nossa visão, a maioria dos países na região são reativos, e não proativos, a eventos pandêmicos. Apesar do eficaz programa de vacinação obrigatória, incidentes como uma epidemia de gripe exótica não são levados em consideração nas provisões para eventos pandêmicos catastróficos.
Desde maio de 2015, o Brasil registrou um aumento nos casos de bebês nascidos com microcefalia, o que pode estar associado ao recente surto do vírus Zika, que infectou cerca de 90.000 pessoas no Brasil de abril de 2015 a abril de 2016, de acordo com o Ministério da Saúde. Apesar do aumento no número de casos confirmados de microcefalia, que totalizaram 1.198 em abril de 2016, entendemos que o impacto nos sinistros seja moderado, dado que o número de casos representa uma porcentagem muito reduzida do número de beneficiários do setor cerca de 24 milhões em março de 2016, considerando apenas entidades com fins lucrativos (49 milhões de entidades do setor em geral) e que cerca de 92% dos casos reportados ocorreram no Nordeste, que corresponde a aproximadamente 6% do número total de beneficiários das entidades com fins lucrativos.
A ANS determina regras claras relativas a sinistros e contratos. Em nossa opinião, as seguradoras de saúde realizam os pagamentos em linha com os prêmios contratados. Dessa forma, o espaço é muito limitado para cobranças inesperadas no mercado de seguro saúde.
Barreiras à entrada (Positiva)
Em nossa visão, as seguradoras de saúde enfrentam restrições regulatórias mais significativas comparadas às seguradoras gerais. A ANS concentrase na cobertura, serviços e nível de sinistros, bem como nas reservas, capital e investimentos das empresas, embora essas exigências sejam voltadas ao cliente, dado o foco da agência reguladora na manutenção dos serviços. As seguradoras de saúde são obrigadas a submeter vários relatórios à agência reguladora, incluindo informações financeiras e de qualidade dos serviços. Além disso, o alto número de seguradoras a grande maioria das quais sem fins lucrativos torna o setor altamente competitivo e, consequentemente, não atrativo para novos participantes.
Por outro lado, acreditamos que não haja limite de disponibilidade de recursos como informações, sistemas, administração e profissionais. Nas regiões metropolitanas, há várias universidades que oferecem cursos de especialização em áreas como gestão de risco. Além disso, considerando o atual cenário econômico no Brasil, com aumento do desemprego, acreditamos que haja disponibilidade adequada de profissionais com capacidade analítica e técnica no mercado. Em termos de distribuição, há ainda diversos canais possíveis; entretanto, as grandes corretoras detém a maior parte da distribuição de seguro saúde, uma vez que as características técnicas desses produtos dificultam sua distribuição por meio de canais menos complexos, que podem ser usados por outras categorias de seguro.
Perspectiva de crescimento do mercado (Neutra)
O seguro saúde é um dos produtos mais desenvolvidos no Brasil; assim, a penetração no PIB tem permanecido acima de 2% desde 2001. Nos últimos cinco anos, o crescimento dos prêmios brutos subscritos (GPW, ou gross premiums written) totalizou uma média de 14% em termos nominais, alcançando 12,3% em 2015. Esperamos que os prêmios brutos subscritos nominais mantenham a tendência positiva nos próximos dois anos, mas a um ritmo inferior, em torno de 8,0%, dado o atual cenário desafiador e a futura redução no número de beneficiários. Contudo, esperamos uma taxa de crescimento real equivalente a 0,7% em 2016 e 1,2% em 2017. Além disso, estimamos que a penetração de seguros continue estável em torno de 2,4% nos próximos dois anos.
Estrutura institucional (Neutra)
Estrutura regulatória. Avaliamos a estrutura regulatória do setor de seguro saúde brasileiro como intermediária. Consideramos adequada a supervisão do setor, que consiste em uma ampla cobertura regulatória para seguradoras de saúde com e sem fins lucrativos, que seguem regras semelhantes. Todos os aspectos relevantes do negócio das seguradoras de saúde são regulados incluindo sua qualidade financeira, solvência, qualidade dos serviços e preços.
Histórico regulatório. O curto histórico da estrutura institucional e as regras ainda em desenvolvimento de qualidade financeira e solvência respaldam nossa avaliação “fraca” do histórico regulatório. A regulação do setor de saúde é relativamente nova, tendo sido criada formalmente em 2000, com a elaboração de regras formais após a criação da agência regulatória em 1998. Desde então, a regulação progrediu gradualmente, estabelecendo normas mais amplas e sofisticadas. Em contraste, o curto histórico da estrutura regulatória e o fato de que as regras de qualidade financeira e solvência ainda estão em aprimoramento sustentam nossa avaliação “fraca” do histórico regulatório.
Governança e transparência. Em nossa visão, a governança corporativa de seguradoras de saúde brasileiras é adequada, refletindo primordialmente os controles regulatórios. O setor é de certa forma transparente: a ANS publica relatórios trimestrais com destaques do sistema e um sumário anual das demonstrações financeiras não auditadas de todas as empresas reguladas, embora os dados agregados sejam limitados.