Investidores buscam seguro para perdas com riscos políticos

Depois de um 2013 bem complicado, os investidores estão mais ariscos ainda em 2014. E a razão para isso é simples: risco político. Isso torna o dinheiro escasso e caro, principalmente para países emergentes como o Brasil. As eleições, bem como comoções sociais, fraco crescimento do PIB, crédito caro e retomada da economia americana, atraindo os recursos antes direcionados para os emergentes, como Índia, Indonésia, África do Sul e Turquia, são os que mais preocupam os donos da grana.

No entanto, as oportunidades de negócios nesses países são imensas, especialmente no Brasil. Nesse cenário surge o seguro de risco político, um recurso capaz de estimular a coragem dos investidores em apostar em negócios locais. Segundo dados do Banco Mundial, o seguro de risco político movimentou cerca de US$ 100 bilhões em 2013 e deverá repetir o volume neste ano com a compra de apólice que garanta indenização para perdas geradas por quebra de contratos entre governos e empresas privadas, violência política e até mesmo expropriações.

AON Keith Martin 2Para falar deste tema, o blog Sonho Seguro entrevistou Keith Martin, consultor internacional da Aon Brasil. Veja abaixo os principais trechos da conversa.

Como a Aon vê o risco nos emergentes?

A Aon avalia os riscos políticos e regulatório em todos os países emergentes de forma contínua, com apoio da consultoria Roubini. O resultado é um Mapa de Riscos, que agora está on-line de forma interativa, podendo comparar 15 anos de resultados. Ele é composto tanto dos prêmios do seguro de risco político como também de análises realizadas pela Roubini.

Quais são os riscos?

Nos países emergentes, de forma geral, são cada vez mais complexos. O risco que mais cresceu nos últimos anos nestas regiões é de quebra de contrato pelo governo anfitrião – incluindo governos estaduais, provinciais e locais. Isso porque, de forma crescente, investimentos de infraestrutura são feitos via concessões ou PPPs (parcerias público-privado) de longo prazo. E, como muitos “casamentos de conveniência”, há objetivos diferentes dos dois lados. Adicionalmente, governos federais estão devolvendo a autorização de assinar contratos com investidores aos governos sub-federais (estados, municípios) sem, ao mesmo tempo, aumentar a arrecadação de impostos e outras fontes de renda dos mesmos.

O que mais impacta a probabilidade e severidade de risco?

O tipo de investimento (projetos de infraestrutura, energia e mineração, por exemplo, possuem risco mais alto); a nacionalidade do investidor; as relações com o governo anfitrião e/ou presença de um parceiro local; localização no país e medidas de segurança, treinamento dos expatriados; estrutura do investimento (ex: participação de um banco multilateral no financiamento); e impacto no meio-ambiente e nas comunidades locais.

O que podemos destacar do Brasil?

Apesar de o Brasil, de modo geral, ter apresentado um quadro relativamente tranquilo de riscos políticos e regulatórios, o pais recentemente sofreu um pequeno aumento do rating de risco no mapa da Aon e Roubini, de “medium-low” para “medium’.

Quais as principais preocupações dos investidores estrangeiros?

Os tumultos de 2013 (e a preocupação que eles possam voltar, ainda com mais força, em 2014, com a Copa e as eleições); os frequentes câmbios no marco regulatório de vários setores chaves: energia, mineração (novo código mineral), petróleo/pré-sal, e concessões de infraestrutura – e nas regras e tributação de investimentos e aplicações financeiras estrangeiras; bem como o rumo do real e das despesas públicas e, em conjunto, a vulnerabilidade do Brasil aos choques externos (fim de Quantitative Easing nos EUA, por exemplo).

Podemos dizer que o Brasil perdeu a oportunidade de crescer com os mundiais então?

Não. Vale ressaltar que o quadro do Brasil continua positivo, de modo geral. De um lado, o país possui uma grande estabilidade política e econômica (particularmente comparado com alguns países vizinhos). Do outro, apesar de ter outros países, como Chile, Peru e Colômbia, que têm implementado políticas pró-investidor, o Brasil também possui um mercado interno de 200 milhões – consideravelmente maior que esses países juntos.

Quem contrata?

Grandes empresas que têm exposição importante fora do país de origem. Existe, por exemplo, cobertura global, que pode proteger a carteira estrangeira inteira do investidor. Empreiteiras (incl. empreiteiras brasileiras) que querem proteger o seu patrimônio, incl. as suas maquinas contra vários riscos político. Empresas listadas na Bolsa de Valores que querem demonstrar aos acionistas que estão protegendo os ativos internacionais. Empresas nos setores de maior risco: infraestrutura, energia, mineração, petróleo e gás. Empresas menores investindo em países percebidos de serem de “alto risco”: Oriente Médio, África, alguns países da América Latina, alguns países da Ásia.

O que significa alto risco?

Alto risco quer dizer que não precisa ser somente de violência política; pode ser também de interferência política do governo.

E os bancos?

Muitas vezes, os bancos exigem o Seguro de Riscos Políticos, tanto para si como para os investidores nos projetos que eles estão financiando.

Qual o maior sinistro registrado nos últimos tempos nessa carteira?

Infelizmente, como o mercado privado de Seguro de Riscos Políticos é altamente sigiloso, não é possível ter uma resposta completa ou definitiva. Existem também seguradoras públicas – além de algumas instituições multilaterais, elas são agências ou empresas estatais. A grande maioria dos países importantes, como China, Índia, EUA e Alemanha, possuem tais instrumentos – mas não o Brasil. Essas seguradoras governamentais publicam informações sobre sinistros etc.

Mas deve haver um muito comentado e, portanto, público!

O maior caso individual conhecido no mercado é da termoelétrica de Dabhol, na Índia. A quebra de contrato pelo governo do Estado de Maharashtra, durante a construção do projeto de US$2,9 bi no início dos anos 2000 resultou em sinistros na casa de US$ 800 milhões. Outros casos chamativos foram os mais de US$500 mi de sinistros de violência política oriundos da breve guerra civil na Líbia, principalmente em lucros cessantes. (Durante a guerra civil, o fluxo de petróleo nos oleodutos foi interrompido por vários meses.) Também no Irã – pós-revolução (1979-1980). O novo governo islâmico expropriou uma grande gama de investimentos estrangeiros, particularmente dos EUA e do Japão, resultando em grandes perdas e sinistros.

O que o seguro de risco político cobre?

Há cinco coberturas no Seguro de Riscos Políticos, que podem ser contratadas juntas ou separadamente:
· inconvertibilidade e transferência da moeda, que inclui demora excessiva e não inclui desvalorização da moeda
· violência político inclui guerra, guerra civil, terrorismo, tumultos, greves, comoção civil e atos dolosos. Pode incluir tanto danos materiais como também lucros cessantes oriundos de tal atos.
· expropriação – inclui expropriação direta (exemplo: Repsol na Argentina) como também a “paulatina”, onde uma serie de ações do governo derruba o controle do investidor estrangeiro do investimento. Também considera todas as autoridades públicas – governos federal, estadual/provincial e local e, dependendo da estrutura, agências e empresas estatais.
· quebra de contrato – cobre qualquer obrigação direta do governo para com o investidor estrangeiro, seja de compra ou venda de serviços. Como exemplos podemos citar a inclusão de contrato de longo prazo de compra de energia; contrato de venda de gás ou água à empresa. Como em expropriação, a definição de “governo” inclui todas as autoridades públicas. Aqui não cobre obrigações e contratos entre o investidor estrangeiro e empresas privadas – só com o governo. Pode incluir, por exemplo, obras de construção, o “wrongful call” de garantias (performance bond, bid bond entre outros).

Como lidar com as disputas jurídicas?

Como a seguradora não quer entrar no mérito da disputa, já que, geralmente, o governo anfitrião alega algum mau desempenho do investidor para justificar a quebra, ela normalmente exige que o investidor ganhe na justiça/arbitragem primeiro. Se o governo se recusar a respeitar a decisão de arbitragem, a seguradora paga o sinistro e fica com os direitos do investidor, e vai tentar ressarcir do governo.

Há coberturas específicas para projetos de infraestrutura?

Sim, há a cobertura de Não-cumprimento de garantias soberanas. Essa cobertura geralmente só se aplica a projetos de infraestrutura e energia que se beneficiem de garantias do governo. Parecido com quebra de contrato, essa cobertura indeniza o investidor caso o governo anfitrião não honra – por qualquer motivo – uma garantia dada pelo mesmo. A diferença é que não há justificativa ou defesa do governo para não pagar. Com outras palavras, dispensa o processo de arbitragem. Se o governo não pagar por qualquer motivo, a seguradora paga e tentar ressarcir do governo em seguida.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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