Um toque feminino sempre traz mais emoção a uma gestão empresarial neste mundo que até pouco tempo atrás era dominado por homens. Agora temos uma mulher no comando da Associação Brasileira de Gerentes de Risco (ABGR). Cristiane Alves, em sua primeira entrevista mesmo antes de assumir o cargo, vai com certeza colocar a entidade no contexto da indústria de seguros. Há opinião para tudo. Até mesmo para assuntos polêmicos, como as mudanças nas regras do resseguro determinadas pelo governo no início deste ano. “Além da insegurança jurídica que isso trouxe, o aumento do custo será inevitável, sobretudo porque haverá menos capacidade”, afirma.
Cristiane Alves, gerente de risco da Pirelli, assumiu o comando deixado por Andres Holownia, da Scania, que se aposentou e passou a atuar como consultor. Por ser a vice-presidente, Cristiane Alves passa a ser a presidente da ABGR a partir do dia 30 deste mês e ficará no cargo até o final do ano, quando haverá eleição para a nova diretoria da entidade. Mas, com certeza, se houvesse eleição, ela venceria, tamanho o seu carisma, competência como vice e posicionamento ao tratar de assuntos relevantes. “Nosso país nunca trabalhou em mercado aberto, então existe deficiência de conhecimento técnico, seja por parte de quem vai “vender” o seguro, seja por parte de quem vai “comprar”a cobertura”.
Ela começou sua carreira fazendo o bê-a-ba do seguro, comprando proteção para a Pirelli em transporte, vida, importação e exportação, em 1991. Com a sofisticação da indústria de seguros, sua função também foi ficando cada dia mais interessante, passando a ser Risk Management. Quando a Pirelli assumiu o comando da TIM, entre 2002 e 2007, Cristiane passou a ser a gerente de risco da operadora de telefonia, no Rio de Janeiro.
Ao retornar a São Paulo em 2009, ela poderia ter seguido o rumo da advocacia. “Gosto tanto de seguros, que nunca exerci a profissão de advogada. Voltei e assumi a gerência de risco da Pirelli para a América Latina”, conta a executiva, que participa da ABGR há dez anos e também é membro da ALARYS e integra a diretoria da International Federation Risk and Insurance Management Association (IFRIMA).
Veja abaixo os principais trechos da entrevista concedida à jornalista Denise Bueno.
Quais os desafios e oportunidades que a indústria internacional de seguros apresentam para a nova presidente da ABGR?
O grande desafio da indústria internacional de seguros é adaptar-se ao nosso ambiente, à nossa cultura, a nossa política, a nossa legislação e, sem dúvida, a forma como o seguro se operacionaliza no Brasil.
Pensei que isso já fosse uma página virada…
Infelizmente, apesar de avanços, ainda somos burocráticos e lentos. Dependemos de mão de obra especializada para operar na indústria de seguros e resseguros. Nosso país nunca trabalhou em mercado aberto, então existe deficiência de conhecimento técnico, seja por parte de quem vai “vender” o seguro, seja por parte de quem vai “comprar”a cobertura.
Bem, além desses desafios ainda há uma nova regulamentação.
A nova regulamentação da Susep também é um grande desafio. O maior neste momento, acredito. O mercado estava investindo pesado em nosso país e as regras mudaram de uma hora para outra sem prévio debate. Isto é muito ruim para a nossa imagem, além de complicar a gestão do negócio para todos. Acredito que independente do setor, aquelas empresas que não possuem uma área estruturada para fazer a gestão de risco, certamente já estão encontrando dificuldade para contratar suas coberturas e certamente essas dificuldades irão aumentar à medida que começarmos a sentir os reflexo da aplicação das novas resoluções O aumento do custo será inevitável, sobretudo porque haverá menos capacidade.
Além do risco de aumento de preço, como os associados da ABGR sentiram as mudanças nas regras de resseguro?
O nosso Brasil precisa dar a mensagem de estabilidade jurídica para captar resseguradores interessados em todos os riscos do país e também investidores em seguros e resseguros, seja qual for o tipo de negócio. Neste aspecto, a modificação das regras de resseguro não foi de qualquer ajuda. A abertura do mercado contou com regra inteligente para que a transição fosse tranquila e tal regra foi apoiada em termos jurídicos, legitimada e não só legalizada, por todos. No entanto, alterá-la da noite para o dia sem o envolvimento dos interessad os no debate para esta alteração, cria a sensacão de insegurança jurídica, ainda que, acredito, este não tenha sido o objetivo da superintendencia ao expedir as fortes modificações no final de 2010 e inicio de 2011.
Há também oportunidades..
Este é um grande momento do Brasil na economia internacional. As grandes obras de infraestrutura em geral e para os eventos da Copa e dos Jogos Olímpicos, sem dúvida é o grande atrativo para a indústria do seguro. Apesar da dificuldade que será sentida pela restrição de capacidade em consequência das resoluções, as oportunidades neste período são imensas. Além disso há um grande mercado a ser explorado junto aos pequenos e médios negócios que crescem em nosso país. Também há grandes oportunidades para os seguros massificados, que necessariamente devem ser explorado com a forte concessão de crédito à população de baixa renda. A Previdência Privada deve ser explorada junto a população de rendas mais restritas.
As empresas hoje já compram apólices com padrão internacional?
O Brasil deve e será forçado a pensar como país de primeiro mundo e, logo, a se comportar como tal. A necessidade de estar atento aos temas relacionados a responsabilidade social, consumidor/cliente e crescimento sustentável nos obriga a nos proteger contra danos e comprovar àqueles com quem nos relacionamos que estamos protegido e também que gerenciamos o risco. Hoje é comum respondermos a questionários de clientes e fornecedores que querem entender se temos BIA, BCP, seguro etc. E aumenta a frequência com que aparecem estes questionários para a minha área.
O que os acionistas esperam da área de gestão de riscos?
Uma área que agregue valor ao seu negócio e não aquela área de “seguros” que apresenta a conta no final do mês para pagar a apólice. Eles querem uma área capaz de entender as exposições do negócio, que trabalhe fortemente para reduzir as exposições, fazendo-se valer das várias ferramentas disponíveis para otimizar aquilo que se paga como prêmio de seguro. Hoje, em todas apólices, é preciso fazer muito profundamente a gestão de risco, desde o seguro de all risk para as plantas até o benefício de saúde dos funcionários.
O que o mercado de seguros precisa fazer para atender melhor as necessidades de seguros das grandes empresas?
O mercado em geral necessita de capacitação técnica. Ficamos preocupados porque encontramos pouquíssimos cursos de capacitação de pessoal, de forma geral, seja de corretores, seguradoras ou resseguradoras e, infelizmente, também de gerentes de riscos. A capacitação é um passo fundamental e deve ser uma preocupação de todos nós.
O que seria um mercado ideal?
Em um mercado ideal, o cliente sabe o que quer e busca o broker que por sua vez, ajuda na busca do que quer o cliente e contribui com outras alternativas, aprofundando o tema. A seguradora, tenta atender a grande empresa não apenas para ter o seu nome na lista de clientes mas para poder tomar a primeira participação no risco, não se transformando a seguradora em um segundo broker, mas sim em participante pleno do mercado, tomando e correndo risco, sobretudo, garantindo ganhos de uma boa subscrição. O ressegurador por fim, luta para que além dos prêmios possa ter um security que lhe dê tranquilidade no mercado. Ou seja, novamente: a seriedade e capacidade de subscrição de negócio é fundamental.
Já está tudo pronto para o grande evento da ABGR em outubro?
Estamos trabalhando muito para o evento. Na verdade, estou pegando “o bonde no meio do caminho”, apesar de já estar na diretoria da ABGR, posso dizer que muita coisa já foi feita pelo Andres e a equipe da ABGR que também sempre faz um belo trabalho. Acho que a cada seminário o resultado é melhor, mas este em especial acredito que seja o grande seminário da ABGR. Os motivos são os mesmos que fazem de nosso país um sucesso hoje. A economia está aquecida, nosso país precisa de cobeturas para poder crescer e tudo isso já seria o bastante para atrair mercado para o evento. No entanto, as resoluções também estão aí e, sem dúvida, serão o grande destaque e foco de debates durante todo o evento.