Brasil sedia discussão mundial sobre seguros

Nesta sala, na qual infelizmente só pude entrar para tirar essa foto (o evento é fechado à imprensa), vão acontecer interessantes debates hoje e amanhã. São mais de 100 executivos de grande destaque, sendo 50 CEOs de seguradoras e resseguradoras, presentes no 38o encontro da Geneva Association, líder internacional thinkthank do setor de seguros. Os CEOs abordam quais são os desafios da indústria e quais as melhores estratégias para aprimorar as práticas do setor, tendo como meta ofertar produtos e serviços mais adequados às necessidades do cenário mundial.

Esta é a primeira vez que o encontro acontece no Brasil. Mais de 30 executivos de seguradoras e resseguradoras tem interesse em conhecer mais de perto esse país que está sob a mira dos holofotes do mundo por ter se saído bem da crise financeira de 2008, que ainda castiga as maiores economias do planeta. A outra parte dos CEOs apenas aproveita a reunião para visitar o país e acompanhar de perto o bom desempenho da subsidiária local, que participa a cada ano com uma parcela mais significativa do lucro obtido pelo braço internacional do conglomerado. Entre eles Michael Dieckmann, CEO mundial da Allianz, e Kunio Ishihara, membro do board da Geneva Association e CEO mundial do grupo segurador japonês Tokio Marine. Temos também Henri Castries, CEO mundial da AXA, que começa a montar uma estrutura local após ter deixado o Brasil em 2006.

Relatos daqueles que participaram dos eventos passados ressaltam a qualidade das palestras e debates, sem mencionar qualquer discussão que possa causar danos a imagem do setor. Mas o que está sendo discutido lá ficará restrito a esse pequeno número de pessoas. Uma pena. O que posso trazer aqui é apenas um relato oficial, com a explicação aos leitores de que insisti muito para poder acompanhar as discussões. “Jamais um jornalista pode entrar para acompanhar os debates”, me responderam os organizadores. Comentei que isso era só um hábito, que poderia ser mudado caso alguém mostrasse os benefícios de inovar, de tentar algo diferente. Afinal, neste evento não há o que esconder. Pelo contrário. Há muito a ser revelado para a sociedade que pouco, ou nada, conhece sobre o lado bom do setor. Mas a resposta final foi: “Sinto muito, não foi possível desta vez”.

O que me trouxe grande ânimo. “Desta vez” sinalizou um avanço, algo que pode mudar. Acredito que pelo menos no próximo encontro, que será realizado em Washington, Estados Unidos, a participação da imprensa seja algo mais factível. Afinal, ninguém quer mais um discurso pronto. As mídias sociais estão ai exercitando a liberdade de comunicação. As pessoas querem interagir e ir além em suas descobertas.

Fico pensando no tamanho do banco de pautas que teria ao participar deste evento. 50 CEOs do mundo todo!!! Seguradoras e resseguradoras que estão reconstruindo o Japão em tempo recorde. “Até o momento estimamos perdas econômicas entre US$ 200 bilhões e US$ 300 bilhões, sendo algo próximo a US$ 33 bilhões em indenizações pagas pelas seguradoras às pessoas que tinham apólices”, contou o CEO mundial da Tokio Marine.

Aos profissionais da imprensa são reservados exatos 45 minutos em uma coletiva, com três CEOs do conselho de administração da entidade. O que também já é um avanço, uma vez que só depois de 36 reuniões a entidade decidiu convocar os jornalistas para compartilhar com a sociedade estudos de tanta qualidade. Até então, o encontro era restrito aos participantes.

Vamos então a divulgação oficial. Neste ano, como em 2010, os principais tópicos são “Estabilidade Financeira em Seguros” e “Mudanças Climáticas em Seguros”. Esses dois temas são vitais para que a indústria tenha flexibilidade para criar produtos com preços acessíveis e ter capital suficiente para ofertar valores de indenizações a altura da necessidade dos milionários projetos em andamento em todo o mundo, principalmente em economias como China e Brasil.

Ter produtos inovadores com oferta de capital adequada ao tamanho do projeto estão intimamentes ligados aos dois temas por exigirem musculatura e flexibilidade dos participantes do mercado. Se para controlar a solvência os órgãos reguladores exigirem muitos controles, o custo final do produto será elevado para atender a tantas burocracias e aumento de patrimônio. Por outro lado, as mudanças climáticas associadas a um risco desconhecido, como a exploração de petróleo na camada pré-sal ou usinas nucleares, podem afetar drasticamente a solvência do mercado.

Um exemplo de autoregulação do setor é o caso do maior acidente ecológico já registrado. O vazamento de petróleo da British Petroleum, no Golfo do México, não contava com seguro por ser usada uma tecnologia nova e portanto com riscos desconhecidos. O seguro obrigatório para exploração de petróleo era muito baixo até então – não chegava a casa do bilhão. Após o acidente, tanto o governo americano como as empresas do setor de petróleo buscam viabilizar proteções que evitem o estrago causado ao meio ambiente e a todos os afetados, desde os pescadores até mesmo os acionistas do projeto de exploração de petróleo.

E foram buscar nas seguradoras, que vivem de gerenciar riscos, uma alternativa. Atualmente, a indústria de seguros estuda coberturas de até US$ 10 bilhões, mas que são precedidas de uma profunda análise de risco e embasadas pelo conhecimento técnico das empresas perfuradoras. O preço, que pode chegar a 10% do investimento na extração do petróleo, dependerá de fatores como profundidade, área geológica, histórico das empresas envolvidas, risco conhecido e desconhecido. No caso do vazamento nuclear no Japão, o mesmo cenário de cautela por parte das seguradoras, exatamente para evitar uma onda de insolvência no setor. Nem mesmo calcular o valor dos prejuízos é possível. Quem dirá pagar por eles.

Se há riscos nos quais a atuação ainda é limitada, há um universo de oportunidades criadas com o novo desenho da economia mundial. Quais serão as soluções apontadas para riscos novos, como a exploração do pré-sal pela Petrobras. Como as seguradoras e resseguradoras vão viabilizar a cobertura desses riscos ainda desconhecidos, que utilizam uma tecnologia ainda não testada? O que elas têm a oferecer aos governos de países para mitigar riscos catastróficos que consomem cada dia mais os recursos governamentais direcionados para investimentos em infraestrutura que precisam ser realocados para socorrer vítimas? E o bônus da longevidade, como isso afetará a sociedade e os riscos das seguradoras?

No Brasil, por exemplo, os riscos de inundações saltaram de um valor médio anual de US$ 250 milhões para algo em torno de US$ 1,2 bilhão apenas com as chuvas fortes que castigaram, no início do ano, a região Sudeste, com destaque para o Rio de Janeiro e São Paulo, informa estudo da Swiss Re. Ameaças que colocam pessoas, infraestrutura e empresas em risco. Mais de 800 pessoas e mais de 100.000 pessoas ficaram desabrigadas com as chuvas intensas nos dois estados, fazendo com que o governo federal e estadual direcionem verbas para ajudar, ainda que de forma precária, para pessoas que perderam tudo.

No Haiti, por exemplo, a região que sofreu com o terremoto há mais de um ano ainda sofre com os destroços, miséria e epidemias. Já no Chile, na Nova Zelândia, na Austrália e no Japão, onde o governo e a população contam com programas de seguro, a recuperação foi mais rápida. De que forma esses recursos poderiam ser direcionados para programas de gerenciamento de riscos? Como equipamentos de alerta para a população ter tempo de fugir do local? Ou uma vistoria nas galerias fluviais antes do período certo de chuvas em janeiro? Afinal, o lucro do setor vem exatamente de executar bem essa técnica: quanto melhor gerenciar os riscos, mais reduzem acidentes e menos indenizações precisarão ser pagas, podendo aplicar o lucro na expansão da atuação do grupo.

Esse seleto grupo de executivos, responsáveis por quase a totalidade dos US$ 4 trilhões em vendas de seguros anualmente, o equivalente a 4% do PIB mundial, começou a delinear as respostas para essas perguntas na manhã desta quinta-feira. O que já sabemos é o resultado da pesquisa divulgada ontem aos jornalistas. “As seguradoras apoiam a necessidade de melhoria da estabilidade financeira e concordam que o risco sistêmico deve ser abordado. Mas é preciso entender que bancos e seguradoras operam de forma totalmente diferentes e por isso precisam ser regulados de forma diferente”, disse Nikolaus von Bomhard (foto), que juntamente com a equipe da associação percorre os quatro cantos do planeta ecoando o refrão “companhia de seguro não é banco”, para alertar as autoridades e também o G-20 sobre a necessidade de ter regras sobre solvência diferenciadas para ambos.

Uma pesquisa realizada com os filiados da Geneva Association revelou que 95% estão preocupados com a falta de transparência nos processos de regulação do sistema financeiro mundial; 87% classificam como prejudicial para a indústria a aplicação das mesmas regras aplicadas a bancos; 73% acreditam que a definição de preços das apólices seria afetada pela imposição de custos de capital adicionais; 75% afirmaram que a maior exigência de capital desviaria recursos estratégicos para investimentos em expansão; 75% apontaram problemas para subscrever riscos por redução da capacidade imposta pelas regras ditadas pelos órgãos reguladores em busca de aumentar a solvência mundial do sistema financeiro.

Em relação às mudanças climáticas, a pesquisa revelou que 79% dos associados acreditam que os governos não progrediram nas políticas de investimentos para mitigar riscos, 82% afirmaram que o gerenciamento de risco do governo poderia melhorar e 95% sugeriram que os governos devem usar mais os especialistas em risco do mercado de seguros para ajudar a mitigar riscos a que a população está exposta.

Essa foi a abordagem oficial. Até tentei obter mais informações. Mas, assim como no ano passado em Zurich, Suíça, quando pela primeira vez a imprensa foi convidada para uma coletiva pela associação, neste ano o acesso de qualquer pessoa era controlado por seguranças atentos a cumprir ordens. Um passo a mais e lá estava o profissional pedindo para os jornalistas se limitarem ao local reservado para a coletiva.

Quem sabe em 2012 os jornalistas (inclusive eu) tenham notícias além da divulgação oficial, o que será bem mais interessante para os leitores que buscam algo a mais do que o convencional. Vamos torcer, pois nós, brasileiros, já conseguimos muitos avanços na economia e em seguros. Em 1992, quando comecei a cobrir o setor, as seguradoras nem assessoria de imprensa tinham. Nem para barrar o jornalista, nem para ajudar que o repórter conseguisse apurar melhor uma idéia de pauta, nem para divulgar releases com informações oficiais. Agora 100% das companhias tem assessorias, dos três estilos. Cabe ao jornalista ir além, mesmo quando parece não poder.

Essa foto, por exemplo. Será que revelará algo importante no futuro?

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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